Os alunos do curso de administração aprendem (de acordo com H. Mintzberg) que a estratégia além de ser premeditada, ela surge...emerge. Vejam a materia com o técnico Bernadinho da seleção de Volley, publicada na revista Época.
Contei com o imponderável
O técnico Bernardinho lembra seu erro de estratégia na derrota para Cuba na Olimpíada de Atlanta


"Na Olimpíada de 1996, em Atlanta, nos Estados Unidos, eu era técnico da seleção feminina de vôlei. Quando as chaves (grupos de times) foram definidas, desenhei a estratégia que seguiríamos. Cuba era a grande favorita. Era a seleção de vôlei que botava medo em todo o mundo.
Vi quem seriam os adversários de Cuba e os nossos, pois estávamos no mesmo grupo. Prometi às meninas que, se ficássemos em primeiro ou segundo lugar na chave, só enfrentaríamos Cuba novamente na final. A cada jogo que vencíamos, eu reforçava a estratégia. E fomos vencendo jogo a jogo, de olho na final com Cuba.
O problema foi que Cuba não cumpriu sua parte no meu plano. Cuba perdeu da Rússia, por isso tivemos de enfrentá-la na semifinal. A semifinal é uma etapa muito mais tensa do que a final. Se você ganha, pode disputar o ouro. Mas, se perde, dependendo dos outros resultados, pode estar fora da Olimpíada. Foi um choque pegar Cuba justamente nessa fase. Perdemos por 3 a 2 num jogo muito duro, as meninas ficaram arrasadas. Gerei uma expectativa que virou uma grande frustração.
A estratégia tem um papel muito importante num campeonato e no desempenho dos jogadores. Acredito que metas não são impostas. Na realidade, estabelecemos um pacto. Ao criar uma estratégia, mostro o caminho para a equipe, explico os motivos por trás daquilo, e as pessoas, à medida que entendem, aderem àquela ideia e se comprometem. Meu erro foi montar uma estratégia inteira baseada em algo que estava fora do meu controle: o bom rendimento de Cuba. Acabei criando uma ilusão. Quando as coisas não saíram como prevíamos, a equipe ficou emocionalmente abalada.
Depois da derrota para Cuba, a gente tinha outro desafio. Haveria só um dia de intervalo antes de disputarmos o bronze com a Rússia, outra equipe de primeira linha. As garotas estavam arrasadas. O desafio era transformar aquela frustração numa reação produtiva para buscarmos o bronze. Tínhamos pouco tempo para restaurar o ânimo. Não dava para ficar remoendo a derrota. Era aprender e seguir em frente. No dia seguinte, todos esperavam um treino leve. Afinal, tínhamos uma partida que valia medalha pela frente. E as jogadoras estavam exaustas. Decidi dar um treino pesado, do tipo “arrasa quarteirão”. Daqui a pouco, ouço uma jogadora comentando com a outra: “Minha perna está doendo muito. Vai ser difícil jogar amanhã”. Aquela foi a primeira observação que me deu uma certa tranquilidade. Era a confirmação de que as jogadoras estavam começando a pensar no jogo seguinte. Estavam deixando a derrota para trás. O foco estava na próxima batalha, a única que importava naquele momento.
Deu certo. Conquistamos a medalha de bronze, num jogo difícil contra a Rússia. Cuba levou o ouro. Hoje, tomo muito cuidado com a mensagem que passo para os jogadores. Não podemos contar com o que não controlamos."